Carla Nascimento
gazetaonline.com.br
Sem quadra de esportes ou biblioteca, a Escola Municipal Coronel Virgínio Calmon, em Colatina, está longe de ser um exemplo de modernidade. Em cinco das sete salas de aula não há janelas, a circulação de ar e a iluminação dependem de um recurso em alvenaria (conhecido como cobogó). O piso não possui cerâmica, e o quadro verde para giz ainda é o centro das atenções. Ainda assim, a escola deixou para trás estabelecimentos de contam com inovadores aparatos tecnológicos e tirou nota 7,9 no Índice de Educação Básica (Ideb), a maior média do Estado. Com isso, tornou-se a única unidade de ensino capixaba entre os dez melhores índices do país entre alunos de 1ª a 4ª série do ensino fundamental.
O que poderia ser considerado um entrave na Educação é usado a favor dos estudantes. A falta de biblioteca é suprida pelos livros guardados na sala dos professores e por um “canto de leitura” em cada sala de aula. Na prática, é uma estante com títulos bastante conhecidos dos alunos, já que os professores contam uma história no final de cada turno.
O investimento em leitura e produção de textos é um dos carros-chefe da metodologia de ensino na escola. Mas para a diretora da unidade, Rita de Cássia Sirtoli Toso, a melhoria na aprendizagem não pode ser explicada por apenas um fator.
“Penso que o que favorece o crescimento dos alunos é ter um grupo de profissionais compromissado, ter baixa rotatividade de professores e a possibilidade de conhecer o aluno e a comunidade em que ele está inserido. Conhecendo esse aluno, você pode intervir de maneira que ele cresça. Durante muito tempo da vida, a gente pensa que todo mundo tem que crescer igual, que todo mundo tem que fechar a prova, tirar dez. Mas não é assim. Hoje sabemos que o importante é que todos aprendam, mas cada um no seu ritmo, no seu nível”, ensina.
Nas paredes, os nomes dos alunos aparecem em sacos plásticos onde são colocados os trabalhos individuais, na lista de aniversariantes do mês e numa espécie de pauta que registra, diariamente, se a agenda foi assinada pelos pais e se as tarefas foram realizadas.
E não foi apenas no Ideb 2009 que a Escola Cel Virgínio Calmon chamou a atenção de autoridades e pais de alunos pelo bom desempenho. O pequeno laboratório de informática foi adquirido, em 2007, como prêmio do Ministério da Educação (MEC) pela primeira colocação das crianças das séries iniciais no Espírito Santo no mesmo índice. Na época, a média da escola foi 5,8.
Trajetória
Rita de Cássia Sirtoli Toso- Diretora da Escola Municipal Cel. Virgínio Calmon, de Colatina
“Há anos não temos taxa de evasão na escola”
Com 16 anos de atuação na Escola Municipal Coronel Virgínio Calmon, em Colatina, a diretora, Rita de Cássia Sirtoli Toso, fala sobre as estratégias da unidade para driblar as dificuldades encontradas na rede pública, conseguir um índice de evasão igual a zero, aumentar a participação da família na vida dos alunos e conquistar o primeiro lugar do Ideb no Estado.
Antes de trabalhar nesta escola, qual foi sua trajetória profissional?
Eu me formei em Magistério em 1983, e em Pedagogia, em 1990. No início da minha carreira, trabalhei em uma escola do campo, dava aula de 1ª a 4ª série do ensino fundamental e até fazia a merenda dos alunos. Depois, dei aula na Escola Ernesto Corradi, em Colatina. Fui professora um ano e diretora por quatro anos. De lá, vim para a Escola Virgínio Calmon.
O que mudou na Escola Virgínio Calmon desde que a senhora começou a trabalhar nesta unidade?
Cheguei à escola em 1994. Já fiz de tudo um pouco: fui professora, fiquei um tempo na secretaria e na direção. Esse é o segundo período que estou como diretora nesta escola. Humildemente, falo que desde quando cheguei a estrutura física melhorou muito. Mas o compromisso com o aprendizado é o mesmo. A escola sempre foi muito respeitada, e devemos isso a todos os ex-funcionários. Prova disso é que várias autoridades no município estudaram aqui.
No Ideb de 2005 e 2007, a escola teve nota 5,8 e, em 2009, foi 7,9. Como a senhora vê o resultado?
O peso desse resultado para a escola é muito grande. Aumenta a responsabilidade, o compromisso de se tornar ainda maior. Somos cobrados, mas, ao mesmo tempo, cobramos mais de nós mesmos e dos alunos. Cada vez que chega um professor novo, ele entra no ritmo desse compromisso.
Qual a formação dos professores?
Todos os professores da escola têm curso superior e participam da formação continuada em serviço, inclusive eu. Procuramos aplicar os conhecimentos adquiridos na formação.
O professor acompanha o aluno?
A turma que fez a prova do Ideb no ano passado foi acompanhada pelo mesmo professor por dois anos seguidos. O normal é o mesmo professor acompanhar a turma de 1º e 2º ano do ensino fundamental, mas, às vezes, isso acontece com as séries seguintes também.
Qual é a taxa de evasão dos alunos?
Há anos não temos taxa de evasão na escola. É uma comunidade privilegiada em Colatina, e temos uma estratégia para reduzir a evasão. Se o aluno falta dois dias seguidos, o professor informa à administração da escola, que localiza a família para saber o porquê desse aluno está faltando. A gente visita as casas, quando necessário, e faz esse trabalho de conscientização.
E as taxas de aprovação?
São muito boas. No ano passado, a maior taxa de reprovados foi menor que 4%. Mas pode ser melhorado. Tenho dez alunos com idades defasadas para a série, na escola. Desses, quatro têm necessidades especiais, o que requer um tempo maior de escolarização.
Qual o segredo para ter um desempenho melhor do que a média das escolas particulares?
O que a rede particular tem de diferencial é uma parte social superior à nossa: tem piscina, faz passeios. Usamos as armas que temos. E o que nos temos é um professor qualificado, com experiência, e uma comunidade ativa. Primamos pelo ler e escrever e pelas operações matemáticas. Para isso, usamos uma quantidade grande de jogos matemáticos e livros.
A escola participou do Programa de Avaliação da Educação Básica do Estado (Paebes Alfa)?
Sim. E foi muito bem em relação às demais unidades de Colatina e do Estado. Porém percebemos que nosso 3º ano não está com um rendimento satisfatório, o que não nos agradou. Fizemos a análise para tentar mudar a situação.
Há casos de violência na escola ou no entorno?
Essa comunidade do entorno é tranquila, apesar de a gente perceber que nos últimos anos estão aparecendo pontos de drogas. Hoje já tem pai de aluno preso, situação que não havia. Quando isso acontece, a gente tenta tratar a criança da melhor maneira possível, sem exposição, e fazer contato com quem ficou responsável.
Como é a participação da família?
Temos cinco reuniões de pais por ano. A primeira, no início do ano letivo; e uma, ao final de cada bimestre. A frequência é excelente. Em uma turma com 30 alunos, cerca dois ou três não vêm. Quem não vem tem que comparecer na escola, com dia e horário agendado.
Como vocês conseguem tanta adesão?
A maioria dos pais dos alunos trabalha em fábrica de costura, porque temos um polo de confecção no bairro. Então, fazemos a reunião à noite, depois do horário de serviço.
Ambiente lúdico, com móveis novos e coloridos
Desde 2007, a Escola Cel Virgínio Calmon recebe alunos de educação infantil. As crianças receberam salas novas, que em nada lembram as dos colegas do ensino fundamental. Os 60 alunos dos turnos da manhã e da tarde estudam em um ambiente lúdico, com móveis novos e coloridos. A sala tem janelas e piso de cerâmica. Nas salas, uma boneca dá vida a uma atividade baseada no livro “Os Cabelos de Lelê”. No mesmo ano, a unidade recebeu do município a cobertura para o pátio interno, um dos locais onde os alunos fazem atividades de Educação Física.
No meio da praça, uma árvore que, no lugar de fruta, dá livro
Quem vai a Colatina não deve se surpreender se encontrar livros pendurados em uma árvore no meio da praça. A iniciativa faz parte do projeto “Colatina: Cidade Leitora”, que tem como objetivo estimular o hábito da leitura e inclui ainda outras ações.
A medida, de acordo com a secretária municipal de Educação, Maria Auxiliadora Torezani de Oliveira, é um dos fatores que contribuíram para o bom resultado das escolas do município no Ideb. “Temos 32 escolas de ensino fundamental, e apenas duas não atingiram a meta”, diz.
A Escola Cel Virgínio Calmon, que ficou em 1º lugar, também participa do projeto. Lá, uma vez por semana, uma turma faz uma apresentação para todos os alunos da escola com base em uma obra literária.
“Temos apresentação de jogral, textos informativos, fábulas, contos, declamação de poesias, o professor escolhe”, afirma a diretora da escola Rita de Cássia Sirtoli Toso.
Investimento
A cidade investiu 32% da receita em educação, no ano passado, ou seja, R$ 48 milhões. Isso significa que o investimento por aluno foi de R$ 3.090,00, por ano.
O recurso, admite a secretária, é fundamental para manter a qualidade no ensino, mas não basta. “A formação continuada dos professores, uma equipe gestora muito boa e o envolvimento da família também influenciam no desempenho de uma escola”, diz.
Sobre a estrutura das unidades, ela diz: “Em 2009, 30 escolas tinham laboratório de informática. Agora, mais três receberão. Também queremos implantar bibliotecas em todas elas”.
O que faz a diferença
Estrutura: A escola tem 315 alunos de educação infantil e de 1º ao 5º ano (antiga 1ª à 4ª série) do ensino fundamental. A turma com mais alunos tem 30 estudantes; e a com menos, 19 alunos
Professores: A escola conta com 17 educadores. Todos participam do curso de formação continuada, uma vez por mês. Nesse dia, os alunos têm aulas com um oficineiro treinado. Os pais são avisados da substituição com antecedência
Família: Os pais de alunos participam ativamente das atividades escolares e recebem informações detalhadas do desempenho dos filhos
Conselho de escola: Formado por dois representantes dos professores, dois do quadro administrativo, dois alunos, dois representantes de pais, e dois representantes da comunidade, que não têm filhos na escola. O conselho tem o papel de fiscalizar, decidir sobre a aplicação de verbas e recursos pedagógicos
Aulas: Os alunos perdem poucas aulas por ano. Nos dias de jogos da Copa, por exemplo, o horário de entrada foi antecipado em 40 minutos para que eles pudessem ser liberados mais cedo
Matérias: A prioridade da escola é desenvolver o hábito da leitura e a capacidade matemática dos alunos
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