Família israelense quer gerar um neto de filha morta
A justiça permitiu que a família congelasse os óvulos, mas não que os fertilizasse.
Uma família congelou os óvulos da filha, morta em um acidente, e agora quer gerar um neto. O esperma viria de um banco de doadores anônimos. Ou seja, se a justiça autorizar a inseminação, dá pra dizer que o bebê vai nascer sem pai, nem mãe.
Um desafio para a ciência e a justiça começou numa rua na cidade de Kfar Saba, norte de Israel. No dia 7 de julho, a jovem Chen Aida Ayash, de 17 anos, foi atropelada ao cruzar uma faixa de segurança. Depois de uma semana em coma, ela teve morte cerebral.
Assaf Noy, advogado da família Ayash, conta que os pais autorizaram a doação dos órgãos. E pediram que os óvulos da jovem também fossem retirados.
Apesar de terem outros três filhos, os pais quiseram preservar a possibilidade de terem netos, filhos de Chen. A justiça permitiu que a família congelasse os óvulos, mas não que os fertilizasse. Afinal, ela era solteira e menor de idade. A retirada dos óvulos de uma mulher morta para a futura fecundação é inédita no mundo.
O caso emocionou a equipe do Hospital de Kfar Saba.
“Choramos, não podíamos respirar”, contou uma médica, ao saber que uma criança poderia nascer nessa situação.
O médico Adrian Shulman, que extraiu os óvulos da adolescente, ficou surpreso com a autorização para a retirada.
“Não me senti confortável com a decisão. Não sei se concordo. É preciso discutir muito esse assunto, do ponto de vista ético, para saber se podemos continuar ou banir para sempre esse procedimento”, diz Adrian Shulman, diretor do hospital.
O juiz deu à família um prazo de três meses para decidir o que vai fazer. Os pais de Chen podem optar por doar os óvulos para um casal infértil. Mas se quiserem usá-los para ter um neto, vão ter que entrar com nova ação no tribunal.
Caso consigam a autorização, haverá mais polêmica. Chen tinha um namorado, mas a família poderia recorrer ao banco de sêmen, depois teria que encontrar uma mãe de aluguel que aceite emprestar seu útero. O que para a família Ayash é agora uma questão de foro íntimo, para o mundo pode representar uma revolução na maneira de se construir uma família.
Como um casos desses seria tratado no Brasil? Por aqui, o Conselho Federal de Medicina, órgão que normatiza as práticas médicas, não tem registro de um caso igual ao de Israel.
“Aqui no Brasil, nós teríamos uma dificuldade muito grande em admitir essa possibilidade do congelamento de óvulos de uma mulher com menos de 18 anos de idade, quer dizer na verdade uma adolescente”, aponta Guilherme Calmon, professor de Direito Civil da Uerj.
No país, já houve casos de mães que usaram o sêmen congelado de maridos para inseminar óvulos. Foi o que aconteceu com Kátia, de Curitiba. O marido dela, Roberto, foi diagnosticado com câncer. Antes de morrer resolveu congelar o sêmen para que o casal pudesse realizar o sonho de ter um filho. E em junho de 2010 Katia deu à luz Luiza Roberta.
Mas no caso de a mãe já ter morrido, o problema fica mais complicado por envolver a necessidade de uma barriga de aluguel.
“Você vai ter não só a maternidade de substituição, a barriga de aluguel, como uma reprodução post-mortem, porque a mulher que forneceu o óvulo e que seria a mãe jurídica não está mais viva”, explica Guilherme Calmon.
O Conselho Federal de Medicina exige que a pessoa, antes de morrer, deixe a sua vontade de ter filhos registrada.
“Do ponto de vista ético, há a prerrogativa, a necessidade, de uma autorização por escrito”, diz Carlos Vital, presidente do CFM.
Foi o que fez Aldimar. Ela e o marido fizeram duas inseminações artificiais e perderam dois filhos.
“São meus anjinhos. Como eu falo: nós somos pais de anjos”, diz Aldimar de Souza Silva, administradora de empresas.
Os óvulos que não foram implantados no útero dela estão congelados. E ela assinou um documento que permite que, no caso dela morrer, eles possam ser usados pelo marido para gerar filhos deles. Ou que sejam doados.
“Eu pensei assim: ‘poxa, vou estar morta, meus óvulos estão aqui. Vão ser jogados fora? Por que jogar fora? Eu vou doar para uma pessoa que não pode ter um filho também’”, conta Aldimar.
“O Congresso Nacional ainda não editou lei tratando sobre tema específico da reprodução assistida, muito menos reprodução post-mortem, menos ainda de congelamento de óvulos. Temos uma total ausência de leis sobre o assunto”, explica Guilherme Calmon.
Tanto em Israel, quanto aqui no Brasil, essa é uma polêmica que ainda deve gerar muitos debates.
Fantástico
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