sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Hermafrodita: Principal causa é mutação genética

Ocorrência de genitais ambíguos é rara; Brasil não tem estatística.
Jornal afirmou que a corredora sul-africana Caster Semenya é hermafrodita.


Jornal australiano 'The Sydney Morning Herald' afirma que exames realizados durante a competição atestam que a atleta Caster Semenya é hermafrodita (Foto: AP)

O hermafroditismo é a presença em um indivíduo de genitais ambíguos – com estruturas masculinas e femininas completas ou não – desde o nascimento. Até os dois meses de gestação, homens e mulheres têm a genitália idêntica. O que os diferencia, a partir desse momento, é que a presença do cromossomo Y no embrião do sexo masculino (em especial um gene denominado SRY), produz proteínas que orientam para a formação dos genitais masculinos e para a ação da testosterona, o hormônio sexual masculino. No feto do sexo feminino, a ausência do gene SRY estimula a formação de genitais femininos. Não há estimativa de ocorrência de casos no Brasil, explica o médico geneticista Salmo Raskin, presidente da Sociedade Brasileira de Genética Médica. “Não temos ideia da incidência porque no país as doenças raras não têm nenhum acompanhamento, por falta de estrutura.

Enquanto o país não tiver uma política de atendimento em genética no SUS, não se pode falar em incidência de doenças genéticas no país”, diz. “Além disso, muitas vezes os pais escondem o problema.” Com 16 anos de experiência na área, Raskin calcula já ter atendido mais de 200 casos. “Já atendi casos de moças de 18, 19 anos que me procuraram porque não menstruavam. A razão, simplesmente, era porque não tinham útero.”




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    Já atendi casos de moças de 18, 19 anos que me procuraram porque não menstruavam. A razão, simplesmente, era porque não tinham útero"



Aparentemente este é o caso da atleta sul-africana Caster Semenya, campeã dos 800 metros no Mundial de Berlim, em agosto. De acordo com o jornal australiano "The Sydney Morning Herald", exames realizados durante a competição atestam que a fundista é hermafrodita: ela não possui ovários, apesar de na aparência externa apresentar órgão sexual feminino. O laudo definitivo só sai em novembro.

Há três tipos de hermafroditismo: o hermafroditismo verdadeiro, o pseudo-hermafroditismo masculino e o pseudo-hermafroditismo feminino.

No primeiro caso, o indivíduo apresenta ovários e testículos e os órgãos genitais externos com estruturas masculinas e femininas. Geneticamente, a maioria dos hermafroditas verdadeiros tem em cada célula dois cromossomos X – os homens normais têm um cromossomo X e um Y e as mulheres, dois X. Portanto, eles deveriam ser mulheres. O desenvolvimento dos testículos se deve a alterações em genes ainda desconhecidos que atuam como o gene SRY do cromossomo Y, responsável pela formação dos testículos.

No segundo, o indivíduo é um homem (XY) do ponto de vista genético, mas o pênis não se desenvolve completamente. Trata-se de homens não completamente virilizados, por lacunas no desenvolvimento sexual embrionário.

No terceiro caso, ocorre o inverso. As mulheres apresentam dois cromossomos X e têm o aparelho reprodutor feminino completo, mas durante a fase intrauterina sofrem um processo de virilização dos genitais: o clitóris cresce excessivamente e se apresenta como uma estrutura semelhante ao pênis.

Uma das causas possíveis é genética. Mutações no gene CYP21A2 (que se encontra no braço curto do cromossomo 6) resultam na deficiência de uma enzima, a 21-hidroxilase. O nome da doença decorrente dessa deficiência é hiperplasia congênita da supra-renal (HCSR), que ocorre em 1 em cada 17 mil nascimentos, segundo a Sociedade Brasileira de Triagem Neonatal. Certas formas desta doença põem em risco de morte a criança com 7 a 14 dias de idade, pois há perda de sal e desidratação severa e rápida, que, se não tratada com urgência, pode levar a óbito.

A escassez da enzima 21-hidroxilase impede a síntese do hormônio cortisol, produzido nas glândulas supra-renais. Numa reação em cadeia, a falta desse hormônio aciona uma glândula da base do cérebro, a hipófise, que intensifica a produção de outro hormônio, o hipofisário corticotrófico, estimulante da atividade das supra-renais. Em resposta a esse estímulo, as supra-renais aumentam de tamanho e produzem mais hormônio masculino, a testosterona. Nos fetos do sexo feminino, o excesso desse hormônio provoca virilização: as mulheres nascem com um clitóris hipertrofiado, que lembra um pênis, e uma bolsa escrotal sem testículos, que recobre completamente a vagina.

Há também causas não genéticas. Quando a mulher, sem saber que está grávida, toma hormônios, essas substâncias podem contribuir para a virilização do feto do sexo feminino.

“O tratamento (do HCSR) é com hormônio corticoide. Mas precisa tomar hormônio o resto da vida, pois é um defeito enzimático. E os casais que têm um filho com este problema devem fazer aconselhamento genético antes de planejar futuras gestações, pois o risco de repetição é de 25% em cada nova gestação”, explica Raskin.




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    Atualmente os casos têm de ser acompanhados por equipes com profissionais de várias áreas, sem muita pressa, porque o próprio paciente deve opinar sobre a operação"



O leque de tratamentos também inclui intervenções cirúrgicas, decididas caso a caso e, evidentemente, acompanhamento psicológico. “Hoje em dia mudou muito a visão de tratamento desses pacientes. Há 30 anos cometeram-se verdadeiros erros médicos, era uma fase em que os cirurgiões pediátricos faziam cirurgias corretivas agressivas sem ouvir a opinião dos pais e sem equipe multidisciplinar para assessoras a decisão”, diz o médico geneticista Gerson Carakushansky, professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro. “Atualmente os casos têm de ser acompanhados por equipes com profissionais de várias áreas, sem muita pressa, porque o próprio paciente deve opinar sobre a operação. Só se faz a correção da parte que prejudica a função da criança, por exemplo para urinar. As definitivas ficam para mais adiante, sempre com psicólogos dando apoio à criança e aos pais.” Fonte: G1

Hermafroditismo pode ser curado com cirurgia


Getty Images
Exames confirmaram que 
a atleta sul-africana 
Caster Semenya é hermafrodita
A polêmica em torno do sexo da atleta sul-africana Caster Semenya, que venceu a prova dos 800m no Mundial de Atletismo de Berlim mês passado, colocou em evidência um problema cercado por muito tabu: o hermafroditismo ou a anomalia do desenvolvimento sexual, como dizem os especialistas. A atleta de 18 anos passou por inúmeros testes e exames a pedido da Federação Internacional de Atletismo, que indicaram que ela não tem ovários, mas tem testículos internos, que produzem grande quantidade de testosterona, o hormônio masculino.

"Na maioria dos casos, o individuo tem um pênis pouco desenvolvido ou um clitóris aumentado. Ou seja, um órgão sexual ambíguo. Nos casos em que não é possível se afirmar o sexo do bebê facilmente, equipe multidisciplinar, em conjunto com os pais, opta pelo melhor sexo que deve ser escolhido para aquela criança após uma série de exames", explica Gerson Carakushansky, geneticista clínico e professor da Faculdade de Medicina da UFRJ.

Retirada de pênis
Em março, outra esportista teve sua vida exposta após revelar ter nascido com órgãos sexuais feminino e masculino. A tenista alemã Sarah Gronert, 22 anos, foi submetida a uma cirurgia para extrair o pênis há cerca de dois anos. Um ano antes da cirurgia, Sarah, que é acusada por suas rivais por ter uma força descomunal para uma mulher, chegou a pensar em abandonar o esporte.

"A forma mais frequente da anomalia, também conhecida como pseudo- hermafrodita feminino, ocorre devido a doença genética que acomete a glândula supra-renal, que fica aumentada e secreta hormônio masculino em grande quantidade. O teste genético mostra que as pacientes são meninas", diz Carakushansky.

Segundo o psiquiatra Fábio Barbirato, da Santa Casa de Misericórdia, uma das maiores dificuldades é definir o momento certo da cirurgia para a escolha do sexo que permanecerá.

Corredora desistiu de prova
Um dia após ter o hermafroditismo revelado, Semenya desistiu de disputar os 4.000m no Campeonato de Cross Country da África do Sul. Segundo o treinador Michael Seme, ela "não estava se sentindo bem". O governo de seu país irá "às últimas instâncias" contra a Federação Internacional de Atletismo se a entidade a excluir das competições. O ministro de Esportes, Makhenkesi Stofile, vai procurar advogados para saber se os direitos humanos de Semenya foram violados.



Fraqueza em cromossomo Y é relacionada a anomalias sexuais

do New York Times

Há alguns anos, os palíndromos (frases iguais quando lidas ao contrário) mostraram ser uma característica protetora essencial do Y de Adão, o cromossomo que determina o sexo masculino que todos os homens vivos herdaram de um único indivíduo que viveu há cerca de 60 mil anos. Todo homem carrega um cromossomo Y de seu pai e um X de sua mãe. As mulheres têm dois cromossomos X, um do pai e um da mãe.

A nova reviravolta na história é a descoberta de que o sistema de palíndromo tem uma fraqueza simples, que explica um amplo espectro de anomalias sexuais, da feminização, passando pela reversão sexual similar à síndrome de Turner, até as condições das mulheres que carregam apenas um cromossomo X.


Reuters
Descoberta mostra que sistema de palíndromo tem uma fraqueza simples, que explica anomalias sexuais

Os palíndromos foram descobertos em 2003, quando a sequência de cromossomo Y de bases, representadas pelas letras G, C, T e A, foi inicialmente trabalhada por David C. Page, do Whitehead Institute, em Cambridge, Massachusetts, e colegas do centro de sequenciamento de DNA da Faculdade de Medicina da Universidade de Washington, em St. Louis.
Eles foram uma surpresa total, mas explicaram imediatamente um quebra-cabeça evolucionário bastante sério: como os genes do cromossomo Y são protegidos de mutações prejudiciais.

Ao contrário de outros cromossomos, que podem consertar uns aos outros porque vêm em pares, um de cada pai, o Y não tem sistema de backup evidente. A natureza evitou que ele se recombinasse com seu parceiro, o X, exceto nas pontinhas --caso contrário, o gene que determina o sexo masculino penetraria no X e causaria um caos genético.
A descoberta dos palíndromos explicou como os cromossomos Y conseguiram, com o tempo e a evolução, descartar genes ruins: ele se recombina com ele mesmo. Seus genes essenciais são embutidos com uma série de oito palíndromos gigantes, alguns com até 3 milhões de unidades de DNA em comprimento. Cada palíndromo prontamente se dobra como uma fivela de cabelo, aproximando seus dois braços. O equipamento de controle de DNA da célula detecta qualquer diferença entre os dois braços e pode converter uma mutação para sua sequência correta, poupando os genes Y de danos mutacionais.

Formas de cromossomos
Depois que Page descobriu os palíndromos, ele se perguntou se o sistema tinha fraquezas que pudessem explicar as anomalias do cromossomo do sexo masculino que são objeto de seus estudos. Na edição atual da "Cell", com Julian Lange e outros, ele descreve o que chama de "tendão de Aquiles" do cromossomo Y e a ampla variedade de distúrbios sexuais que ele pode causar.
O perigo do sistema de proteção do palíndromo ocorre quando uma célula duplicou todos os seus cromossomos antes da divisão celular, e cada par é mantido junto em um local chamado centrômero. Logo, o centrômero irá se separar, com cada metade e seus cromossomos puxados para os lados opostos da célula em divisão.

Entretanto, antes da divisão, um grave erro pode ocorrer. Os palíndromos de um cromossomo Y podem ocasionalmente se esticar e formar uma atração fatal com o palíndromo similar de seu vizinho. Os dois Ys se fundem, e tudo, da junção até o fim do cromossomo, é perdido.

Os Ys duplicados gerados assim vêm em uma variedade de comprimentos, dependendo de quais dos palíndromos fazem a ligação indesejada. Como outros cromossomos, o Y tem um braço direito e um esquerdo, com o centrômero no meio. O gene de determinação do sexo masculino fica próximo ao final do braço esquerdo. Se o palíndromo do final do braço direito faz a junção, o resultado é um Y duplicado e muito longo, no qual os dois centrômeros estão amplamente separados. Porém, se os palíndromos que se juntam estão justo à direita do centrômero, um Y duplicado e curto é formado, com os dois centrômeros juntinhos.

Page detectou entre seus pacientes Ys duplicados curtos e longos, além de médios. Ele e seus colegas perceberam, então, uma diferença surpreendente na aparência sexual do paciente que dependia da distância entre os centrômeros dos Ys duplicados.

Os pacientes nos quais a distância entre os dois centrômeros do Y é curta são homens. No entanto, quanto maior a distância entre os centrômeros, maior a tendência de que os pacientes sejam anatomicamente feminilizados. Alguns poucos pacientes eram tão feminilizados que tinham os sintomas da síndrome de Turner, uma condição na qual a mulher nasce com um único cromossomo X.
A explicação para esse espectro de resultados, na opinião de Page, reside em como os Ys duplicados são tratados na divisão celular e nas consequências para a determinação do sexo do feto.

Unidade e caos
Quando os centrômeros estão juntos, eles são vistos como um só e arrastados para um lado da célula em divisão. Desde que o gene de determinação do sexo masculino do Y esteja ativo nas células do tecido sexual fetal, ou gônadas, as gônadas irão se transformar em testículos, cujos hormônios irão masculinizar o resto do corpo.
Todavia, quando os centrômeros estão longe um do outro, o resultado é o caos cromossômico. Durante a divisão celular, ambos os centrômeros são reconhecidos pelo equipamento de divisão celular. No "cabo-de-guerra", o cromossomo Y duplicado pode às vezes sobreviver; às vezes, pode ser quebrado e perdido.

Esses indivíduos podem trazer uma mistura de células, algumas das quais carregam um Y duplicado e outras não trazem nenhum cromossomo Y. Nas gônadas fetais, essa mistura de células produz as pessoas de sexo intermediário. Em muitos desses casos, os pacientes são criados como meninas, mas têm tecido testicular de um lado do corpo e tecido ovariano do outro.

Na versão extrema desse processo, a distribuição das células pode ser de tal forma que nenhuma das células sexuais do feto possui um cromossomo Y, apesar de que outras células no corpo possam tê-lo. Page e seus colegas descobriram que cinco dos pacientes feminilizados tinham sintomas típicos da síndrome de Turner. Os pacientes chamaram a atenção de Page porque suas células sanguíneas continham cromossomos Y. Obviamente, a linhagem das células sanguíneas tinha retido o cromossomo Y, mas as células sexuais do feto não.

Em 75% das mulheres com síndrome de Turner, o X único vem da mãe. "Já que elas são mulheres, todo mundo acha que é o cromossomo X do pai que está faltando", disse Page. "Mas poderia ser facilmente o Y do pai".
Page disse que "é um experimento fantástico da natureza" que o grau de feminização esteja associado à distância entre os dois centrômeros do cromossomo Y duplicado. Apesar de ter estudado o cromossomo Y por quase 30 anos, ele aprendeu que sempre há surpresas.

"Continuo a ver o Y como um parque nacional infinitamente rico, aonde vamos para ver coisas incomuns, e nunca nos decepcionamos", disse ele.
Dra. Cynthia Morton, editora do American Journal of Human Genetics, disse que a nova explicação da síndrome de Turner era plausível. "É mais uma linda contribuição de David Page para a ciência da genética", disse Morton.







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