domingo, 8 de abril de 2012

As razões para ter fé

A fé do dia a dia move (mesmo) montanhas
O que faz algumas pessoas passarem por provações terríveis e conseguir sair inteiras ao final? A resposta passa por acreditar em algo

Quem a vê tão serena não imagina as dificuldades vivenciadas por Sandra Rodrigues. Além do pai, ela perdeu a mãe e a irmã em graves acidentes de carro. Um deles quase tirou também a vida de seu filho. Hoje ela não tem dúvidas: superar as maiores perdas de sua  vida e seguir em frente só foi possível com fé, muita fé.

Histórias como a dela se repetem na vida de inúmeras pessoas que descobriram ou viram suas crenças renovadas em meio a momentos de dor, sofrimento e desespero. Na fé elas encontraram conforto, acolhimento, apoio, esperança e perspectiva. Superaram provações que não esperavam e conseguiram sair renovadas.

Como Sandra Rodrigues, que é pastora da Igreja Batista da Renovação, e se sentiu ainda mais forte no momento da dor. Ela não pôde viver o luto pela mãe e pela irmã porque cuidava do filho que sobreviveu ao mesmo acidente. Naqueles momentos, garante, estava amparada. “Senti uma paz sem descrição em um momento de total desespero”.

Este é um dos trunfos da fé, como pontua dom Rubens Sevilha, bispo auxiliar da Arquidiocese de Vitória, ao avaliar que ela potencializa o ser humano, dá resiliência, que é o que nos faz enfrentar os obstáculos com mais facilidade. “A fé é altamente positiva. Nos permite caminhar com esperança”, assinala ele.


Proteção

Para a Psicologia, como explica Daniela Reis e Silva, terapeuta familiar e especialista em luto, a fé – seja religiosa ou em si mesmo – é um fator protetor que pode ajudar a enfrentar as dificuldades. “Ela leva a pessoa a acreditar que existe um futuro possível, apesar da perda.”

A própria simbologia da Bíblia, ao se referir a fé, faz menção à rocha, ao escudo. Uma força, como pontua o bispo Sevilha, que permite superar os problemas com mais equilíbrio, sem negar que há saudade, dificuldades, dor, sofrimento.

“Ao acreditar”, destaca Dalva Silva Souza, vice-presidente da Federação Espírita do Espírito Santo, “as pessoas – sejam espíritas, católicas, evangélicas, ou de outros denominações –, têm a confiança renovada”.

Vivência


Outra vantagem da fé é estimular atributos sociais, como a vivência em comunidade, a humildade, a bondade e a caridade. No caso de Maria Augusta Bittencourt Campinho estas características foram fundamentais para superar a morte súbita do amor de sua vida.

Foi no trabalho voluntário, realizado no hospital onde um dia seu marido clinicou, que ela encontrou um novo caminho. “Foi tendo paciência para ouvir as dores alheias que percebi situações muito piores do que a minha”, relata Maria Augusta.

Nos anos seguintes ela ainda perdeu dois irmãos, a mãe e o pai, mas conseguiu ver o filhos concluírem curso superior, um deles em Medicina. Foi preciso, afirma Maria Augusta, não se apegar a aspectos negativos e crer: “Não sabia que tinha tanta fé”, admite, emocionada, ao se lembrar de sua trajetória.

Corpo

Ainda não há uma explicação científica, mas tudo indica que a conexão com o espiritual pode também trazer contribuições para o corpo. Embora não haja consenso entre os médicos, estudos científicos apontam que a fé pode ter suas repercussões na saúde, ajudando inclusive na recuperação de várias doenças e até na redução do estresse.

Um exemplo foi a pesquisa realizada em um dos maiores centros de tratamento de câncer da América Latina, o Hospital A.C.Camargo. Ela revela que seis entre cada dez pacientes ouvidos (homens e mulheres) teriam se sentido melhor ou mais dispostos se tivessem recebido também apoio religioso ou espiritual. E mais, que gostariam que este tipo de cuidado fosse incluído no tratamento.

Outros apontam que o risco de se envolver com drogas é menor, assim como o de contrair doenças sexualmente transmissíveis. Há até os que indicam que as pessoas ficam menos angustiadas e sentem menor culpa em relação aos próprios erros, o que ajuda a evitar a ansiedade e a depressão.

O assunto pode até não ser consenso entre os médicos, mas para quem tem fé – e segue dando exemplos de força e superação – ela pode sim ajudar a viver melhor.

Religião
90% - da população do Espírito Santo possuem algum tipo de religião, segundo o Mapa das Religiões da Fundação Getúlio Vargas (FGV). No Brasil, o percentual chega a 93%.

foto: Vitor Jubini
A fé manteve Alexandre e Kátia unidos e permitiu que ele abandonasse o vício

Ele largou as drogas. Juntos, hoje eles têm  uma nova vida

Alexandre Guasti da Vitória, 41 anos, era um músico famoso. Tocava em dois grupos – Samba Sim e Explosão do Pagode – e já tinha gravado até um CD. As conquistas se avolumavam em sua vida, assim como o uso constante de drogas. “Além da cocaína, usava maconha com frequência”, relata o músico.

Uma vida compartilhada com sua namorada – hoje esposa – Kátia Cilene Baldi da Vitória, 40. Para garantir o vício ele não temia os riscos: frequentava com assiduidade bocas de fumo e até dormia na casa de traficantes. “Achava que era feliz. O vazio só aparecia quando passava o efeito das drogas”, lembra Alexandre.

Kátia foi a primeira a perceber que a vida deles precisava mudar. Foi quando decidiu aceitar o convite de uma amiga para um grupo de oração do Santuário de Vila Velha. “Foi um encontro com a fé”, conta. A influência – e até exigência – dela, estimularam Alexandre a abandonar o vício.

Perspectiva
Uma caminhada dura, principalmente quando precisou deixar o samba e os grupos. “Era a profissão que eu tinha, mas, para me livrar do vício, era preciso mudar também de ambiente”, relata Alexandre, que abandonou tudo sem nem mesmo a perspectiva de um novo emprego.

Hoje, casado, pai de dois filhos, e com um emprego de motorista em uma grande empresa, garante: a transformação só foi possível graças a sua fé. “Ela une, motiva, transforma e torna mais fácil enfrentar e superar as dificuldades”, relata.

Até mesmo as que aconteceram nos anos seguintes, como a depressão da esposa, a morte do pai, e as fases de desemprego. “Ter fé nos permitiu descobrir uma nova forma de viver e de ser feliz, valorizando as pequenas coisas e agradecendo”, diz Alexandre. “Mais do que mudar, sinto que evoluímos e que continuamos crescendo”, pondera Kátia.

foto: Edson Chagas
Depois de enfrentar as sequelas de um derrame, Rosângela venceu um câncer

Ela superou a doença e as dores. E saiu ainda mais fortalecida
Aos 31 anos, Rosângela Silva e Souza se viu presa a uma cama. Era o resultado de um AVC (acidente vascular cerebral) grave. Para tudo dependia da ajuda alheia, até para cuidar da filha de seis anos. Não conseguia andar, comer, falar. “Nunca imaginei que viveria uma situação como aquela”, lembra a dona de casa.

Seu desejo de ficar boa era enorme, mas não sabia o que fazer para reverter a situação, apesar dos cuidados médicos. Numa tarde decidiu aceitar o convite de um tio para ir a um culto para doentes. “Entrei carregada e saí andando”, relata Rosângela.

Há anos não tinha contato com a fé – estava afastada da igreja Presbiteriana. Mas, naquele dia, diz que foi resgatada: “Recebi uma chance e não a perderia”.

Vitória
Nos anos seguintes, tratou de fortalecer a sua fé. Hoje, aos 51 anos, não tem dúvidas de que esse trabalho foi fundamental para superar as muitas dificuldades que continuaram aparecendo. Uma delas há quatro anos, quando foi diagnosticada com câncer de mama. “O médico, ao me dar a notícia estava mais abatido do que eu”, diz a mulher, que nunca teve a menor dúvida de que seria curada.

Uma certeza que não foi abalada nem mesmo com a morte de um irmão, aos 51 anos, durante sua quimioterapia. “Ele contraiu uma bactéria e morreu em cinco dias. Não estava nem doente”, conta Rosângela.

Foi a fé que a ajudou a acalentar as dores e compreender a perda. O que dá a Rosângela a certeza de que sua vida foi transformada: “Minha fé me permitiu enxergar além do possível; me permitiu seguir confiante, vivendo o dia a dia”.

foto: Fábio Vicentini
O apoio espiritual ajudou Glício e Sandra a lidarem com a morte do filho

Eles enfrentaram a morte do filho. Mas sabem que não foi o fim
Quando se recuperava de uma dengue hemorrágica que o deixou hospitalizado por mais de um mês, o médico Glício da Cruz Soares recebeu a notícia mais difícil de sua vida: seu filho mais velho tinha morrido em um acidente de carro.

O jovem Antonio Soares Fernandes Neto, o Toninho, era professor de Anatomia da Unesc, em Colatina. Há seis anos, na volta para casa, a van que transportava vários professores foi atingida por um caminhão. Ele morreu a caminho do hospital. “É algo que não dá para imaginar”, relata Glício que, além de ginecologista, também foi médico legista antes de se aposentar.

Sua esposa, Sandra Rocha Soares, cuidou de tudo. “Meu marido estava com a saúde debilitada. Tive que ser uma fortaleza”, relata a mulher, que ainda se emociona ao falar do filho. “Ele estava muito feliz, ia se casar em poucos meses”.

Renovação
Glício nasceu em berço espírita. Há anos, sua esposa também segue a doutrina. No dia do acidente, um grupo estava em sua casa, orando por sua recuperação.

Desde o acidente o casal se tornou ainda mais participativo na comunidade. “Passamos a fazer o culto no lar, a frequentar a comunidade e fazer palestras”, relata Glício.

Foi a fé, não duvidam, que deu a eles a serenidade para seguir com a vida, sem o filho ao lado. “Fica a saudade, a tristeza,  mas sabemos que apenas o corpo dele morreu. O espírito continua vivo”, destaca Glício.
“Sabemos que ele concluiu sua missão”, pontua Sandra, “e que um dia o reencontraremos, junto com outros familiares. Isso nos dá tranquilidade”, complementa o médico.

A GAZETA
Vilmara Fernandes

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